Entrevistas
Mercury Circle: «Não temos regras e até nos desafiamos uns aos outros para se terem ideias ainda mais loucas»
Entrevista com Mercury Circle.

Jaani Peuhu é um músico e produtor multifacetado, contando com inúmeras participações e colaborações em variados projectos – tem os seus Iconcrash e inclui-se no mais recente line-up dos Swallow the Sun. Após o término da promoção a “When a Shadow Is Forced into the Light”, colocou mãos à obra e deu vida aos Mercury Circle, sendo que “The Dawn of Vitriol” é o EP de apresentação. Conversámos com Janni e com Ande Kiiski sobre a banda e sobre os planos para o futuro próximo.
«Quando comecei a compor os temas, não fazia a mínima ideia onde esse processo me levaria.»
Jaani Peuhu
“The
Dawn of Vitriol” poderá surpreender quem tem seguido o trajecto
dos músicos que compõem os Mercury Circle. Aliás, os teus
projectos e outros nos quais marcas presença acabam por serem sempre
diferentes. O que achas que o projecto poderá trazer ao panorama
musical com este EP e outros registos que venham a surgir?
Jaani:
A ideia era criar algo especial e único. E usar as nossas
experiências, de diferentes géneros, a nosso favor com os Mercury
Circle. Quando era criança, achei sempre muito peculiar como o metal
representava símbolos como a coragem e até mesmo a revolta contra
as normas do mercado que regia a música. No entanto, após anos
passados a trabalhar e a produzir artistas de metal e de muitos
outros géneros, comecei a ver que actualmente o metal está cheio de
todos os tipos de regras idiotas que tornam qualquer coisa nova e
interessante realmente difícil de encontrar. Na cena pop e rap, os
artistas competem com quem quer que surja com os arranjos ou
conceitos mais loucos. No metal, porém, houve momentos em que bati
com a cabeça contra a parede como produtor, quando soube que tinha
acabado de criar algo realmente bonito ou esquisito, só
para ver se os artistas não tinham coragem de colocar aquelas ideias
nos álbuns, porque não obedeciam ao livro de regras do género que
tocavam, eram muito isto ou aquilo… Com
Mercury Circle não temos absolutamente regras e até nos desafiamos
uns aos outros para se terem ideias ainda mais loucas e pensar fora
da caixa. Este EP, para mim, dá a ideia de que já vamos na direcção
certa, mas o álbum vai ser um grande salto para outra coisa. Ainda
dá para ouvir que é a mesma banda, mas ao mesmo tempo tudo evoluiu.
É como um surto de crescimento musical.
Quando
iniciaste o processo de composição já tinhas algumas ideias em
mente ou foi a partir de uma tela em branco?
Jaani:
Quando comecei a compor os temas, não fazia a mínima ideia onde
esse processo me levaria. Estava somente a precisar de criar alguma
música nova após o final da digressão com Swallow the Sun e
Hallatar. Após os primeiros temas, percebi que tinha de montar uma
nova banda para este material. Escrevi cerca de 20 canções para o
álbum de estreia, das quais escolhemos as dez que melhor se
enquadravam no que pretendemos apresentar.
Os
temas carregam uma aura muito densa e negra. Há uma atmosfera
pesada. Demonstram que a fórmula para criar música pesada é muito
maleável e depois é conjugada com a melancolia subjacente a todo o
registo. Foi difícil conciliar tudo isto ou tornou-se um processo
natural?
Jaani:
É algo que deve surgir naturalmente. Foi muito bom deixar as coisas
simplesmente acontecerem e perceber que essa combinação de
sentimentos negros com elementos góticos e doom soaram muito
naturais. Honestamente, ao escrever as primeiras músicas, evitei
usar elementos electrónicos, porque queria algo que fosse mais na
linha do ‘verdadeiro doom’, mas depois percebi que estava a fazer
exactamente a mesma coisa que me deixa frustrado quando trabalho com
bandas de metal cheias de regras. Dei uma chapada a mim próprio,
mandei fora as limitações do género e acolhi todos esse elementos
‘não tão metal’ na mistura.
Ao longo dos anos, percebemos que a música também adquiriu uma dimensão visual. Nestes últimos anos, essa mesma dimensão tornou-se maior. É um elemento de promoção que ganhou um novo espaço com a democratização da Internet e a facilidade de acedermos a estes conteúdos. No vídeo de “The Beauty of Agony” regista-se um especial cuidado em estabelecer essa conexão estilística com a vertente sonora. É uma forma de lermos a música dos Mercury Circle nessa concepção como um todo?
Ande: Temos pensado muito sobre o aspecto visual dos Mercury Circle. A música é única e o estilo visual deve corresponder a isso. Depois lançámos o vídeo de “New Dawn”. É uma música muito emocional e triste, e queríamos que o vídeo também carregasse essas emoções. Acho que funcionou muito bem! Temos recebido muitos comentários bons sobre os dois vídeos.
Na
press-release,
e como já referiram,
mencionam a intenção de, ainda este ano, lançarem o vosso primeiro
álbum. O que poderemos esperar desse trabalho, se for possível
adiantar algo sobre ele? É intenção vossa manter os Mercury Circle
o mais activos possível com lançamentos e concertos de forma
regular?
Ande:
Neste momento, estamos a trabalhar no álbum. Será lançado no
início do próximo ano. O material tem muito mais variedade do ponto
de vista sónico comparativamente a “The Dawn of Vitriol”. Já
durante os trabalhos de gravação do novo registo, entrou para a
banda o Jaska Raatikainen – trouxe muitas ideias incríveis para os
arranjos e ajudou-nos a moldar as músicas quanto à sua forma final.
Estamos muito animados com o álbum e a nova formação.
Relativamente a lançamentos regulares e concertos, seremos o mais
activos possível, com certeza.
Jaani: Quando o Jaska entrou,
começámos a sentir-nos mais como uma banda de verdade e não apenas
um simples projecto. Na verdade, eu estava um pouco preocupado
relativamente à forma como ele se encaixaria no grupo, porque ele
vinha de um registo muito diferente praticado nos Children of Bodom,
mas estou muito satisfeito por esse passo ter sido dado, porque o
Jaska trouxe imensas ideias incríveis e não tem qualquer limitação
quando se trata de música. As sessões de gravação da bateria
foram um bocado loucas. Estávamos numa base de testar todas as
ideias que nos passavam pela cabeça. Na verdade, fizemos imensos
takes
– mesmo depois de decidirmos ‘ok, temos
a bateria’ –,
apenas por pura diversão, para vermos o que poderíamos retirar
dali, e muitas vezes algo mágico acontecia. Abordamos coisas na
linha do trip-hop ou imitamos baterias electrónicas dos anos 80,
pensamos no que é que os Genesis fariam agora ou o baterista de
Frank Sinatra…
Actualmente
estamos todos a atravessar um período muito estranho e conturbado
com a pandemia. Existem planos para transportar “The Dawn of
Vitriol” para o palco?
Ande:
Espero que seja possível darem-se concertos a partir do início do
próximo ano se a situação actual da COVID-19 ficar mais fácil.
Mal podemos esperar por subir ao palco e tocar estas músicas!
A paleta de projectos em que participaste é já bastante extensa. Tens projectos teus e alguns deles em silêncio há algum tempo. No caso dos Iconcrash, tens intenção de lançar algo novo já que as últimas notícias remontam a 2012?
Jaani: Não, não estou a pensar fazer isso. Com os Mercury Circle sinto-me totalmente livre para fazer o que quiser como compositor e produtor. Inclusive, estou a pegar em algumas ideias que tinha para os Iconcrash e a trazê-las para os Mercury Circle. Essa paisagem mais sombria e pesada é a que melhor espelha o que sinto. Não penso em playlists de rádio, nem sinto qualquer pressão das editoras para criar sucessos. Posso canalizar toda a escuridão suja que tenho dentro de mim para as minhas composições, e quando esse trabalho a nível melódico e lírico fica terminado, sinto-me muito bem. Sou uma pessoa muito espiritual, mas estou a tentar não trazer muito essa faceta para as letras. Em alguns temas, porém, as influências são mais visíveis, porque não tive outra escolha a não ser dar voz ao mundo dos espíritos.